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A Minha Viagem pelo Cinema de Fellini

Fellini

A Minha Viagem pelo Cinema de Fellini

by Marta Reis

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Federico Fellini entra no Mundo do Cinema como argumentista, seguindo a estética neorrealista e passando, poucos anos depois, a realizar os seus próprios filmes. O nome Fellini e a sua obra já me eram familiares quando comecei a estudar Cinema mas não esqueço a emoção com que vi pela primeira vez o filme La Strada no grande ecrã. Esta é a minha homenagem a este grande nome do Cinema.

O despontar de Fellini

(A Estrada) é realizado em 1954, em Itália, produzido por Dino De Laurentiis e Carlo Ponti. Este filme conta a história de uma rapariga de uma família muito pobre, Gelsomina (flor, em português), que é vendida pela mãe a um homem do circo, Zampanò (burro, em português). Este homem vive apenas para aquilo que há de material, ao contrário de Gelsomina que é espiritual, sensível e poética.

Gelsomina é interpretada por Giulietta Massina, esposa de Fellini, que interpretou outras personagens principais dos seus filmes, explorando as suas personagens de modo a transcender os constrangimentos do dia-a-dia.

Logo no início do filme Gelsomina e Zampanò fazem um teatro em que interpretam dois palhaços, o que retrata, sem dúvida, a relação que os dois vão manter. As crianças vão sempre ter com ela quando está sozinha, abandonada por ele, pois são as únicas que tem capacidade para a compreender, só elas são também ingénuas e sonhadoras.

Zampanò trata-a muito mal e acaba por abandoná-la. Alguns anos mais tarde descobre que ela morreu, e quando o faz fala através de umas grades. A nossa visão é dele estar encarcerado. Mais uma vez embebeda-se, para afogar as suas mágoas, abstraindo-se da realidade, como sempre fez, acabando por olhar o céu, e apercebendo-se da sua condição, das contingências da vida e de que está completamente só. O filme acaba com a visão do mar, tal como começou.

Não sei se Gelsomina teria, na mente de Fellini, alguma relação com Charlot mas, certamente, que essa comparação é evocada nas nossas mentes, talvez pelo seu sorriso forçado, que se assemelha muito ao de Chaplin, mas também pelo seu andar desajeitado.

Esta história, tal como tantas outras deste autor, é acerca de uma renúncia no sentido da salvação. São as cenas que parecem ser importantes que servem de articulação do argumento e as sequências mais longas e descritivas, que parecem não ter tanto interesse para a ação, que realmente importam, como é exemplo a visita ao convento.

O Neorrealismo no Cinema de Fellini

A estética neorrealista abafa a religiosidade italiana, pois esta impunha-se enormemente na época de forma a reprimir o povo. Fellini não a exalta, mas também não a abafa, sendo talvez mais distante, mas dando-lhe um sentido espiritual maior, por estar de certo modo ligado à estética religiosa, pois no final é a espiritualidade que acaba por vencer a força bruta.

Apesar de estilisticamente ser realista, o seu conteúdo é extremamente simbólico, tendo Fellini neste filme cortado a sua ligação à estética neorrealista, pois considerava que também a realidade espiritual deveria estar presente, e não apenas a realidade social.

 

Fellini filma personagens que não são típicas, mas pessoas. O tratamento que faz delas deixa de ser colectivo, enquanto que segundo a estética neorrealista eram definidas de acordo com as circunstâncias sociais; passando a ser individual, tornando-se personagens tipo de atitudes perante a vida.

Por causa disso foi acusado de traidor à causa do Neorrealismo e atacado por diversos críticos, entre os quais Zavattini, mas atraiu a atenção de todo o mundo, ganhando um Leão de Prata no Festival de Veneza de 1954. Nesta altura já tinha reunido o grupo de colaboradores com quem iria trabalhar a maior parte da sua carreira.

Em La Strada nota-se bem a sua obsessão pelo circo, que ganha uma dimensão extremamente poética em diversos filmes, como por exemplo em I Clowns, de 1970, mas também a sua ligação ao teatro medieval italiano e à Commedia dell’arte. Usa ainda, como já referi, personagens típicos de certos comportamentos psicológicos, notando-se dois elementos que sugerem um certo surrealismo: o cavalo e a banda de música que passam por Gelsomina sem nenhuma razão aparente, surgindo uma maior quantidade de elementos surrealistas nos seus filmes seguintes.

Segundo crítico francês André Bazin executou cortes sombrios e rectificações de montagem, que demonstram certas falhas da ação no argumento, tendo em (As Noites de Cabíria, 1957) conseguido já compor um argumento de mestre. O tempo parece não existir, notando-se apenas quando os acidentes ocorrem, modificando o destino dos heróis, e que também as personagens não existem, pois não evoluem, só mudam interiormente. Bazin afirma ainda que relançou oportunamente o cinema italiano, tanto no interesse do público, como na estima dos intelectuais, não pensando que faça verdadeiramente uma ruptura com o Neorrealismo, dando antes uma mostra da criatividade do génio da escola italiana.

(1974) um filme mais autobiográfico do que o normal, mas menos extravagante do que os anteriores, parece ter retornado, verdadeiramente, ao Neorrealismo, tendo sido sempre influenciado por este movimento na falta de forma e circularidade da narrativa, mas estruturando o seu trabalho através da força da sua personalidade e das suas obsessões, utilizando a comédia da vida para criar o seu próprio circo.

O seu principal tema foi o do mistério da identidade, a sua ou a de personagens interpretadas por Giulietta Massina. Objetivou estados de espírito subjetivos recorrendo ao potencial do cinema que achava estar a ser desperdiçado, como demonstrou. Os seus frescos e imagens intoxicantes criam estados mentais de fantasia, nos quais a realidade é reinterpretada pela imaginação do artista. Combinou as duas temáticas que sempre dominaram o cinema italiano: a tradição épica, com o gosto pelo espetáculo; e a humanitária, preocupada com os marginais e os oprimidos.

Juntamente com Antonioni criou a segunda renascença do cinema italiano do pós-guerra quando o cinema italiano entrava em declínio, devido à morte do impulso Neorrealista, produzindo apenas entretenimento. A sua criatividade extravagante e estilo carnavalesco, aliados à realização de filmes extremamente originais, entre os quais está, sem dúvida, La Strada, tornaram-no num sinónimo de cinema italiano para a imaginação popular.

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