10 Documentários onde a morte é assunto principal
Da literatura ao cinema, passando pela música: a morte é um tema recorrente. Desde o início dos tempos que este tema tem desempenhado um papel fundamental nas artes, assumindo-se quase como uma personagem (em certos casos, representada como a figura encapuçada com uma foice).
Vejamos, por exemplo, Romeu e Julieta, de Shakespeare. Durante séculos (e ainda hoje) o final trágico das personagens foi merecedor das lágrimas e aplausos da audiência. Na música, a morte também lá se encontram, como acontece com o êxito dos Queen, Bohemian Raphsody, que arranca com a confissão “Mama, just killed a man”.
Porém, a visão que temos da morte, seja nos filmes, na música ou nas páginas dos livros que tanto lemos, é por vezes mais romântica do que o conceito da morte com que temos de lidar todos os dias. Sem histórias e floreios, a morte é apenas um ponto final seguido pelo luto, pela saudade e, eventualmente, pela aceitação.
Na tentativa de mostrar a morte como ela é, apresentamos neste post uma lista de 10 documentários cinematográficos que abordam o tema, desmistificando ideias pré-concebidas que não correspondem à realidade e desafiando efeitos chocantes relacionados com a própria morte.
10 Documentários que mostram a morte como ela é
Night and Fog (1955)
Night and Fog é um relato importante sobre a Alemanha Nazi e sobre a forma como os judeus viviam os campos de concentração. O documentário mostra aquilo que restou de Aushwitz e Majdanek, através de fotografias e imagens de arquivo. Além de contar os factos como eles foram, o realizador Alain Resnais procura estabelecer um contacto com o público ao mostrar as atrocidades cometidas.
Num período que ainda não era assim tão distante da II Guerra Mundial, Night and Fog põe-nos a olhar diretamente para a morte, colocando-nos na pele de quem passou realmente por aqueles campos de concentração. No ecrã surgem as imagens das câmaras de gás e pilhas de corpos humanos. O objetivo não é lembrar-nos do que aconteceu, mas fazer com que nunca nos esqueçamos.
The Act of Seeing With One’s Own Eyes (1971)
Lançado no ano de 1971, The Act of Seeing With One’s Eyes não era um documentário para estômagos fracos. Ao longo de cerca de meia hora, vemos imagens de autópsias feitas por especialistas forenses numa película experimental que pode chocar. O filme é não-narrativo e tem assinatura do cineasta norte-americano, Stan Brakhage.
The Act of Seeing With One’s Eyes foi filmado na cidade de Pittsburgh e, em certa medida, pode ser visto como uma crítica social à sociedade e aquilo que somos. Colocando-nos ao mesmo nível, o filme transmite a mensagem que no fim de contas somos todos carne. Corpos, e nada mais do que isso.
Des Morts (1979)
O documentário Des Morts oferece-nos uma comparação entre rituais de morte em todo o mundo. A partir do ecrã, o espectador parte numa viagem que começa numa morgue em São Francisco e termina numa pequena comunidade rural na Coreia do Sul. Desta forma, a morte e todos os tabus visuais que lhe estão associados são esclarecidos, apresentando o luto sobre uma grande variedade de ângulos.
Se o mundo ocidental parece ser representado pela frieza dos hospitais e a formalidade das agências funerárias, no oriente o luto assume-se como uma manifestação expressiva, como se tratasse de uma relação primitiva com a natureza e a ideia da coletividade. Ao mostrar as disparidades entre os lugares, Des Morts, dirigido por Jean-Pol Ferbus, Dominique Garny, e Thierry Zeno, revela a coexistência de diferentes atitudes em relação à morte devido a origens sociais, históricas e religiosas diferentes.
Shoah (1985)
Não há imagem nenhuma capaz de transmitir o quão horrível foi o holocausto. Esta é opinião de Claude Lanzmann, cineasta que traduziu para o ecrã os retratos diretos de quem passou pela experiência e sobreviveu. Ao longo do documentário vemos os testemunhos de homens e mulheres que falam na primeira pessoa sobre genocídio.
Juntamente com os relatos traumáticos, vamos acompanhando os espaços vazios daqueles que outrora foram campos de trabalhos forçados. Repleto de memórias, o filme demorou 11 anos até estar concluído. O resultado foi um trabalho violentamente real, mas que não deixa de ser um retrato fundamental sobre aquilo que foi o holocausto.
Near Death (1989)
Near Death não é apenas sobre a morte em si, mas sobre o fim da vida. Munido de câmaras de filmar, o americano Frederick Wiseman visitou doentes em estado terminal do Boston’s Beth Israel Hospital. A narrativa começa por mostrar o local como um sítio, impessoal, um mero edifício repleto de corredores labirínticos.
É nesse mesmo edifício que encontramos pessoas cuja vida não tardará a desaparecer. A película foi elogiada pelo cariz humano, mostrando como são os últimos dias de todos nós. Ultrapassando as questões da vida e da morte, o filme é responsável por nos mostrar a velhice e a vida como ela é nos seus últimos dias.
Grizzly Man (2005)
Vale a pena viver para quê? Ou, reformulando a pergunta, vale a pena morrer por quê? Para Timothy Treadwell a resposta é clara: uma vida que valha a pena viver e uma morte que valha a pena morrer só pode ter lugar entre os ursos pardos de uma reserva no Alasca. Sim, é isso mesmo que leu.
O filme de Werner Herzog intercala imagens captadas pelo próprio Treadwell assim como entrevistas feitas pelos seus amigos, familiares e especialistas em natureza. Desta forma, é retratada a viagem de um homem que morreu entre o meio que mais valorizava, onde a natureza e as suas crenças pessoais comungavam em sintonia com a paz e os animais.
Os efeitos angustiantes do filme não são produzidos devido à morte como uma interrupção abrupta ou evento inesperado. Na verdade, é exatamente o contrário o que se sucede: a antecipação da morte não violenta como uma possibilidade, obrigando o espectador do filme a entender a mentalidade de Timothy Treadwell.
The Bridge (2006)
Lançado no ano de 2006, The Bridge fala-nos de um local onde os suicídios são muito comuns: a Golden Gate Bridge, de São Francisco. A obra documental é o resultado de um trabalho de longa data: durante um ano, o cineasta Eric Steel manteve uma câmara apontada para a ponte, capturando as várias tentativas de pôr fim à própria vida.
Havendo uma suspeita, a equipa de filmagem contactava as autoridades. O material conseguido serviu para criar um documentário com testemunhos de amigos das vítimas e familiares, mostrando os motivos (ou a aparente falta deles) que levaram à morte premeditada. O resultado final é um importante relato sobre os quão frágeis todos nós somos e sobre o quão determinante é o contexto social nas nossas vidas.
We Were Here (2011)
Através das histórias de quatro homens gays e de uma mulher, We Were Here regista-se como uma crónica comovente e coletiva sobre o início da epidemia do HIV – ou, como era frequentemente chamada, a “praga gay” – elaborada por aqueles que viveram de perto nesta época de morte e luto.
O bairro gay em redor da Castro Street, em São Francisco, no início dos anos 1980, é retratado como um lugar de liberdade sexual habitado por uma comunidade dinâmica e política. Além do problema epidémico do HIV, o documentário de David Weissman e Bill Weber toca também em temas como o ativismo e lutas sociais.
United in Anger: A History of ACT UP (2012)
United in Anger: a History of ACT UP é um documentário realizado por Jim Hubbard e escrito em parceria com Ali Cotterill. A obra documental conta as consequências da crise provocada pela SIDA e procura denunciar a indiferença dos membros da ACT (AIDS Coalition to Unleash Power).
Com entrevistas que não deixam ninguém indiferente, United in Anger: a History of ACT UP conta histórias de despedidas dolorosas, ganância e negligência. Tudo isto num documentário capaz de mostrar uma crise humanitária que merece todo o destaque possível.
The Act of Killing (2012)
Controverso e inflamatório, o de The Act of Killing já ocupou o seu lugar na história do cinema. Após receber bastantes ataques no que diz respeito a questões éticas, o filme de Joshua Oppenheimer seguiu o esquadrão da morte mais influente no Norte de Sumatra, responsável pelos massacres anticomunistas de 1965-66.
Uma das sequências inesquecíveis do cinema contemporâneo diz respeito ao momento catártico em que o líder do esquadrão, Anwar Congo, tenta vomitar após mostrar onde fazia as torturas e assassinatos. Um auto-exorcismo agonizante e não intencional de um homem que, como qualquer outro membro do esquadrão da morte, tem grande orgulho pelo que fez no passado.
Edificados sobre recriações dos horrores vividos e carnificinas, o documentário usa os verdadeiros assassinos e as suas memórias para reconstituir o passado através de formas fictícias, sádicas e impiedosas. Asfixiante e instigante, The Act of Killing é uma viagem assombrosa.