Solveig Nordlung: a versatilidade de uma mulher do cinema
Nasceu em Estocolmo, Suécia mas foi por Portugal que a realizadora Solveig Nordlung se apaixonou. Hoje, após ter conseguido cidadania portuguesa, divide a sua câmara entre ambos os países. Com uma mente criativa muito ligada à ficção científica, resultado do fascínio que nutre pela escrita de J. G. Ballard, a realizadora transportou inúmeras vezes para o grande ecrã visões futuristas e cenários distópicos. O mais curioso é que as personagens dos seus filmes foram vividas mais do que uma vez por atores nacionais como Margarida Marinho e Miguel Guilherme.
Do cinema ao teatro passando pela televisão e a rádio, Solveig Nordlung faz de tudo um pouco. Porém, é ao cinema que dedica a maior parte do seu tempo. No seu currículo, podemos encontrar trabalhos e aprendizagens ao lado de nomes como Manoel de Oliveira, João César Monteiro e João Botelho. Entretanto, a sua filmografia como realizadora conta com mais de 10 filmes, entre os quais uma belíssima curta-metragem baseada num conto de Richard Zimler e ainda um documentário sobre o autor António Lobo Antunes.
Em 2002, tive a oportunidade de entrevistar Solveig Nordlung. Numa breve conversa, a realizadora sueca falou do seu trabalho, de Portugal e desvendou o segredo de tanta atividade artística.
Goreti Teixeira (GT): Como define a ligação que mantém entre Portugal e a Suécia, uma vez que não é a primeira vez que realiza filmes com atores portugueses?
Solveig Nordlung (SN): Tinha 18 anos quando vim a Portugal e casei-me com um português que também era realizador. Como queria fazer cinema, montamos os nossos estúdios e comecei a trabalhar como assistente. Depois do 25 de abril passei então para a realização, uma vez que nessa altura as coisas ficaram mais facilitadas. Fiz parte do movimento do cinema militante e posteriormente passei para os filmes de ficção. Entretanto, divorciei-me e fui para a Suécia onde tive de recomeçar a minha carreira, tendo feito alguns filmes para televisão. A ligação entre os dois países tem a ver com as realizações que vou fazendo. Por vezes, tenho produções suecas em que Portugal é coprodutor minoritário e vice-versa. Se fizermos uma média, o meu trabalho divide-se em 50% para cada lado. Normalmente, os filmes que realizo são em língua portuguesa, mesmo aqueles que são financiados pelas entidades suecas. As minhas filmagens não se ficam apenas por Portugal e a Suécia, já tenho realizado alguns filmes também em África.
GT: Consegue assinalar algumas diferenças entre os filmes suecos e os portugueses?
SN: A realidade da Suécia que conhece e que me interessa falar acaba por ser a minha infância, que foi passada no campo. Os filmes de ficção que tenho feito lá – média metragem e ensaios – retratam a região Norte da Suécia, de uma sociedade dos anos 50/60. Em Portugal, as películas incidem mais sobre a vida citadina e a cidade de Lisboa. Por exemplo, fiz um filme sobre os jovens delinquentes que matavam motoristas de táxi. O trabalho que realizo aqui envolve assuntos mais atuais.
GT: Sei que é fascinada pela escrita de J. G. Ballard. Esse fascínio traduz-se em quê?
SN: Foi um dos meus escritores favoritos quando vivi em Portugal. Mais tarde na Suécia fiz um programa, onde eram convidados vários escritores e podia escolher os que mais me interessavam. Então decidi fazer uma entrevista com o Ballard para o conhecer melhor, afinal já tinha lido muitas obras suas. O meu fascínio por ele traduz-se na maneira como dá a conhecer as coisas. Normalmente vemos que o problema do mundo é o excesso de população e que a comida não vai chegar para todos. Ballard põe o problema ao contrário e é isso que acontece em Aparelho Voador a Baixa Altitude, onde a população tende a desaparecer porque já não nascem crianças.
GT: Em que critérios se baseou para selecionar este leque de atores?
Não. Escolhi os atores pela qualidade dos trabalhos que têm realizado e também pelo seu aspeto físico. Queria que fossem o mais parecido possível com as personagens do livro.
GT: A Margarida Marinho preencheu todos esses requisitos?
SN: Sim. Acho que a Margarida estava com a idade certa para interpretar esta personagem e além do mais também já tinha conhecimentos sobre a maternidade, porque também já é mãe.
GT: Na sua opinião, o cinema sueco é mais apoiado em termos financeiros do que o cinema português?
SN: Não. Na Suécia há muito mais público para os filmes que se vão fazendo e as receitas de bilheteira têm muito mais importância do que em Portugal. Aqui o cinema acaba por ser praticamente subsidiado, relativamente ao que acontece lá, onde o cinema vive das bilheteiras. Ao contrário do que acontece com os documentários e as curtas-metragens que são apoiadas a todos os níveis, os filmes suecos de longa-metragem são menos favorecidos na Suécia.
GT: Como foi a sua relação com estes atores [de Aparelho Voador a Baixa Altitude]?
SN: Não tirando qualquer mérito aos restantes atores que estiveram muito bem no desempenho dos seus papéis, a relação com a Margarida Marinho foi ótima, porque ela faz uma representação extraordinária.