O Hobbit: o filme que cresceu mais do que devia
Em 2001, o aclamado realizador Peter Jackson fez chegar às salas de cinema a primeira parte de uma trilogia épica inspirada no clássico da literatura O Senhor dos Anéis. O sucesso da história de Frodo Baggins e da Irmandade do Anel rumo ao Monte da Condenação, para destruir o Anel do Senhor das Trevas, gerou milhares de milhões de dólares e isto para não falar, claro, do facto de ter batido recordes nos prémios da Academia, levando para casa mais de 15 Óscares por toda a trilogia.
Era por isso de esperar que o mundo da Terra Média voltasse a ser explorado no futuro. O trabalho de Tolkien, como os fãs sabem, é bastante extenso e vai mais além da história de O Senhor dos Anéis. O autor chegou a escrever a história de todo o mundo, referindo a evolução de cada um dos povos, a ascensão do Senhor das Trevas e o próprio momento da criação do mundo. Material para fazer filmes não faltava (e ainda há muito mais para exporar no grande ecrã, se a família Tolkien o permitir).
Entre as obras do escritor britânico, O Hobbit é talvez o mais popular depois da trilogia O Senhor dos Anéis. Em O Hobbit acompanhamos a história de um hobbit, Bilbo Baggins – o tio de Frodo – e a aventura que tem ao lado de uma companhia de anões que deseja resgatar o seu lar ancestral, ocupado pelo temível dragão Smaug. Mais do que tudo, esta é também a história de como Bilbo Baggins se deparou com Gollum e roubou o Anel após um inteligente jogo de adivinhas.
Mas a produção e realização de O Hobbit foi quase uma aventura tão grande como aquela que as personagens vivem no filme. Após uma complicada luta pelos direitos de propriedade do filme, seguiram-se novos atrasos e várias mudanças na produção e realização do filme. Passaram-se mais de cinco anos desde o lançamento do último filme da trilogia d’ O Senhor dos Anéis quando O Hobbit começou finalmente a ser gravado na Nova Zelândia.
Por essa altura, já estava decidido que o livro de 260 páginas seria transformado também em 3 filmes, algo que não era esperado pelos fãs. Valeria realmente a pena fazer daquela história três filmes ou era apenas uma estratégia de marketing para explorar exaustivamente uma boa história?
Será O Hobbit cansativo?
Após aguardar antecipadamente pelo filme O Hobbit, fui vê-lo ao cinema. Estava realmente ansioso. Era fã de O Senhor dos Anéis há já algum tempo, apesar de não ter ido ao cinema ver a trilogia. Assim, a ideia de ver no grande ecrã algumas das personagens principais de que tinha aprendido a gostar foi motivo suficiente para ir à estreia.
Mas, na minha opinião, O Hobbit perdeu a magia d’ O Senhor dos Anéis e assumiu o espírito comercial que já se esperava. A história estava exageradamente longa, com novas personagens e cenas que não faziam parte do universo criado por Tolkien nos livros. A caracterização era excelente, a interpretação também: o problema estava na história e no facto de ser tão cansativa, longa e desnecessária.
A missão de Peter Jackson e de toda a produção envolvida no filme não tinha sido simples: criar uma história interessante, para três filmes, cada um deles com quase duas horas e meia de filme – as versões alargadas ultrapassam as três horas – com contéudo interessante, que mantenha o espectador na pontinha da cadeira, ansioso para ver mais e mais. Infelizmente, aquilo que pretendiam fazer não lhes caiu lá muito bem. As cenas de luta são longas e exageradas, por exemplo, e em vez de se tornarem excitantes acabam por nos fazer bocejar e ansiar pelo que vem a seguir.
Mas calma, não estou a dizer que o filme é mau. Digam os fãs o que disserem, é sempre bom regressar à Terra Média e ver no ecrã os montes verdejantes do Shire, a magia de Rivendell e até mesmo os orcs obtusos sempre prontos a dar luta. O que quero dizer é que O Hobbit é mau para quem esperou algo tão bom como O Senhor dos Anéis.
A interpretação do Bilbo (Martin Freeman) está entre as minhas partes preferidas do filme. Contratado para ser o ladrão dos anões, o educado e recatado hobbit vê-se de súbito no meio de uma aventura inesperada, num mundo para lá das paredes da sua casinha dentro da montanha e todos os confortos e sossego que os hobbits tanto apreciam. Freeman conseguiu incorporar bem aquilo que sempre imaginei na personagem dos livros.
Os anões são uma confusão. Nunca conseguimos distinguir os treze anões e decorar os seus complicados nomes. Bombur, Bofur, Bifur, Oin, Gloin e por aí adiante. Há quatro ou cinco que acabamos por memorizar, como Thorin Oakenshield (Richard Armitage) mas só o fazemos pelo tempo que receberam no ecrã.
Ainda assim, os anões conseguem ter bons momentos, especialmente quando cantam a música Misty Mountains, uma ode à tragédia causada pelo dragão que conquistou os seus lares e os tesouros aí guardados. Algumas das gargalhadas do público são também conseguidas graças aos anões.
Uma coisa é certa: os momentos emblemáticos que todos os fãs esperavam ver no ecrã estão lá, mesmo com todos os extras que ninguém pediu. Os trolls que sequestram os anões e que Bilbo engana para que se transformem em pedra ao amanhecer, o grande Beorn (Mikael Persbrandt) que se transforma em urso e os recebe na sua casa e, claro, o jogo de adivinhas entre Gollum – que marca o regresso do genial Andy Serkis – e Bilbo.
Estou certo de que todos os fãs de o Senhor dos Anéis viram pelo menos a primeira parte de O Hobbit, apesar de ser incerto se viram as duas sequelas. Atrevo-me a dizer que O Hobbit funciona como um ‘Senhor dos Anéis para crianças’, uma vez que nos poupa a algumas das imagens mais fortes da trilogia.
Porém, quem tiver intenções de se estrear neste universo e o quiser fazer por ordem cronológica (uma vez que os eventos de O Hobbit precedem o de O Senhor dos Anéis) podem ficar desmotivados com as quase oito horas que compõe a trilogia O Hobbit e desistir de ver a seguinte, aquela que é realmente boa. E isso seria uma pena.